5 de setembro de 2014

FORMAS DE JUSTIFICAÇÃO

Giovane Medeiros
Julia Gabriela Warmling Pereira

Em discussões anteriores o objeto central foi uma análise conceitual de conhecimento. Em leitura do livro “Introdução à epistemologia” do professor Luiz Henrique Dutra, analisamos definições tradicionais de conhecimento em que Gettier impõe condições gerais para haver conhecimento e mencionamos também a grande problemática se poderia existir/haver proposições informativas sobre o mundo.

A proposta agora, em um primeiro momento, é discutir o que vem a ser a justificação, já que a mesma possui uma relação íntima com o conhecimento e é de grande interesse para os mais diversos epistemólogos. Este questionamento específico sobre a justificação tem recebido muita atenção, no entanto, será que podemos afirmar que “justificar uma cognição é muito mais forte que explicá-la, muito mais forte que descrevê-la?” Afinal existe alguma diferença em justificar, explicar ou descrever uma cognição? Em que medida há uma associação com a tal justificação, com explicações ou descrições?

Em seu livro, "Introdução à Epistemologia", Dutra aponta algumas hipóteses, que podem apresentar uma "justificação", "explicação" ou" descrição" das alternativas seguintes:
(1) A pessoa roubou o objeto porque estava em situação financeira muito difícil, e percebeu que seu amigo não teria grande prejuízo, já que é rico.
(2) A pessoa roubou o objeto porque tem problemas psicológicos; ela é cleptomaníaca.
(3) A pessoa roubou o objeto colocando-o em sua bolsa.

Para o referenciado autor, a alternativa (1), do modo em que ela se apresenta, oferece uma "justificação" ao acontecimento, ao passo que a alternativa (2) apresenta uma "explicação e a (3) faz apenas uma descrição do fato.

Ao analisarmos estas hipóteses, dependendo do interesse que temos do que aconteceu, uma ou outra parecerá mais apropriada ao caso, ou seja,a escolha a ser feita poderá ser mais relevante, contudo, as demais também possuem sua importância ao acontecimento.

O que vai depender, conforme já aludido, é a escolha da alternativa. Se quisermos uma resposta justificada, esta está ligada diretamente ao fundacionismo, que entra em cena. Agora se preferirmos ou nos contentarmos apenas com explicações em vez de justificações, terá atitudes afastadas do fundacionismo e nos aproximamos das atitudes tipicamente falibilistas, ou seja, uma posição voltada para a descrição do ocorrido.

Pelos comentários anteriores, em certa medida, pode haver "justificações", "explicações" ou "descrições" mais ou menos fortes? Pode haver uma "única explicação"?

Ainda neste panorama, nos esbarramos com outras expressões que Dutra apresenta em seu livro, como a ideia do mundo fragmentado a partir das tentativas de justificar.

Como já vimos, o fundacionismo oferece um mundo completo e hierarquizado enquanto que o coerentismo tem, por sua vez, um mundo unitário e organizado. Existindo outras formas de justificação que, por vezes esse mundo pode ser fragmentado, mantendo ainda uma justificação. Desse modo, a afirmação de que o conhecimento humano apresenta um mundo fragmentado, não quer por assim representar um mundo caótico. E não adotando um ponto de vista solipsista da epistemologia tradicional, que seria a visão extrema do ceticismo, para isso adotando uma visão alternativa. Essa mais ponderada, mostrando uma visão de mundo organizado. Mas, se durante essa justificação, o indivíduo acabar se distanciando do fundacionismo e do coerentismo, ocorrerá possivelmente a fragmentação.

O cetiscismo tem por habitualidade a descrição dos eventos, chamado este de descritivista. Dutra afirma que a descrição de um evento é algo mais fraco que explicá-lo, o que, por sua vez, é ainda mais fraco que justificá-lo.   

Tratando sobre o pirronismo que é denominado assim por conta de Pirro de Élis. O cético pirrônico é aquele que sustenta seu ponto de vista a partir das impressões, aparências. Acredita na materialidade dos objetos que estão na sua frente. E para este, o indivíduo que acreditar em algo além do material, pauta sua tese a partir de um dogma, sendo assim dogmático.

Quine no artigo “Epistemologynaturalized”, de 1960, trata sobre a natureza do conhecimento humano. Quine menciona que a justificação deve decorrer a partir de uma explicação de caráter psicológico e linguístico para as cognições. Tal como na situação do pirronismo. Dito isso, pode se constatar que o naturalismo ou a epistemologia naturalizada corresponde à ideia de que podemos explicar o conhecimento humano como um fenômeno natural, sendo assim, podendo descrever e não necessariamente justificá-lo.

Tratando do exemplo anteriormente citado: a alternativa (2) explicava o acontecimento mas, de certo modo, ela também justifica a razão do roubo.

Relacionando o naturalismo com o mundo fragmentado, é visível que se tem uma posição mais próxima do descritivismo do que o justificacionismo.

Considerando a matéria esplanada, o pirronismo é uma forma de justificacionismo?

Para encerrar, Dutra finaliza o capítulo intitulado “Formas de Justificação”, dizendo que: “Há certa ambigüidade, portanto, no uso do termo “justificação”". A forma de compreender em que sentido determinado autor utiliza o termo, seria perguntarmos em que medida ele associa tal “justificação” com explicações ou com descrições.” (p. 70)

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA


DUTRA, Luiz Henrique A. Introdução à epistemologia. São Paulo: Editora UNESP, 2010.

2 comentários:

  1. A Filosofia da Mente ao longo de sua recente história possui estreita ligação com o modo de proceder da Filosofia Analítica. Neste caminho, a busca por justificação das teses apresentadas com severo rigor argumentativo se tornou um fazer fundamental para os interessados em estudar esta área do conhecimento que, juntamente com os feitos neurocientíficos e computacionais, se tornam critérios necessários desta agenda.

    ResponderExcluir
  2. Sabemos que o valor da teoria é julgado pela exatidão de suas previsões e sua capacidade de resistir ao falseamento. A epistemologia vem procurando demonstrar isto. Para nós do Direito, Ainda nos sentimos carentes de uma teoria inédita, como nos moldes acima. Mas lembro que não estou desmerecendo as atuais teorias das ciências jurídicas, e nem sonhando antecipar oque claro, a vanguarda trará.

    Justificar explicar e descrever são as três formas de entendimento apontadas aqui no texto. Então, existe alguma diferença em justificar, explicar ou descrever uma cognição? Em que medida há uma associação com a tal justificação, com explicações ou descrições?


    Explicar o conhecimento humano como um fenômeno natural, descrevendo-o e não necessariamente justificando-o é uma tarefa bastante árdua. Ainda mais que nos dias de hoje a palavra cognição, vem ganhando desenvolvimento e sustentabilidade, nos mais diversos ramos do saber. Por isso é preciso empenhar de forma correta a descrição desta palavra, com explicação científica, que é claro; se fundamenta, na filosofia. Muito já foi descrevido aqui no blog sobre esta palavra, mas convém relembrar.

    Se voltarmos um pouco no tempo e usarmos um exemplo da persuasão de Dawkins sobre a hipótese de desmoronar o Daisyworld, de lovelock, foi só em 2008 que Richard zeebe e ken caldeira, usaram os testemunhos de gelo, para evidenciar a demonstração da auto regulação da terra, ou seja: quase 30 anos depois, os problemas atuais das emissões do dióxido e carbono, começaram a ganhar fama na “tal plasticidade”. É por isso que a palavra cognição, hoje, precisa ser observada através do atual significado, e reformulada dentro do conceito de plasticidade. Parece difícil de entender, mas quem não se adequar a estas mudanças terá grandes chances de ficar pra trás.

    Mas o que tem haver o sistema de auto regulação da terra e o conhecimento?
    R- A palavra cognição aqui, é o que tem haver. Se somos aparados de um sistema pulmonar; que recebe ar e pode alterar de forma “plástica” o interior da dura-máter, como podemos deixar de justificar ou descrever, que Dawkins, não previu que as emissões de dióxido de carbono, perturbaria o sistema da terra? E que com isso surgiriam evidencias para demonstrar, ou não a sua auto regulação?
    A auto regulação da terra parece ser um molde de como também nós somos atingidos pela poluição. Nossa auto regulação interna parece afetar-se com o dióxido de carbono que tramita entre o fora e o dentro de nosso organismo.
    É por isso que procurei exemplificar o capitulo 5 com um entendimento sobre a comparação, entre plasticidade e cognição.

    A função da inteligência ao adquirir um conhecimento, está hoje amparada nos rolls, que a neurociência vem demonstrando, junto com a medicina, através das diversas formas de pesquisas, que para nós das ciências jurídicas, se mostra de relevante interesse dentro dos diversos ramos, sendo impossível hoje a separação, entre inúmeros saberes.

    Sei que, “a priori” este assunto interessa mais ao direito ambiental, porém, o que está em jogo aqui é que justificar e descrever a química a geoquímica ou a geologia responsabilizando-as pela “cognição plástica” nas alterações funcionais da gênese humana, pode tornar-se uma das empreitadas mais árduas, que conhecemos.


    E quero lembrar que não estou levantando nenhuma bandeira, simplesmente estou unindo, filosofia e ciências, para uma pesquisa mais refinada e apurada. São nestas bases que fundamento meu TCC, optando por clareza, e não repelindo os dois saberes.

    Edson Stofela

    ResponderExcluir

Bem-vindo à discussão!