24 de maio de 2014

REALIDADE E FICÇÃO

Mickhael E. A. Bachmann
Nivaldo Machado

No senso comum costuma-se entender a realidade como aquilo que há. Talvez se possa dizer que em qualquer meio pode-se entender a realidade desta forma. Poder-se-ia dizer que realidade é aquilo que realmente há, mas seria redundante. Não parece haver problema com o termo. O problema consiste em saber, afinal, o que realmente há. É neste campo que ocorrem, basicamente, as disputas entre realistas e antirrealistas. Um defensor do realismo pode sustentar seu posicionamento de diversas maneiras: pode dizer que as coisas que são descritas como X existem e que a existência das coisas é independente de nós ou que não são coisas produzidas pela nossa mente, linguagem ou esquema conceitual; que aquilo que é afirmado sobre X não é redutível a outras afirmações que possam ser de outra coisa senão X; que aquilo que afirmamos de X tem condições de verdade, que constituem descrições precisas de alguns aspectos do mundo, sendo que sua verdade ou falsidade se dá em função do próprio mundo e de seus fatos; que podemos obter verdades sobre X e que é apropriado acreditar completamente no que afirmamos sobre X.

Há uma variada gama de posicionamentos que se opõem a um ou vários dos enunciados defendidos pelos realistas: céticos, por exemplo, negam que coisas descritas como X existam ou negam que tenhamos qualquer direito de afirmar qualquer coisa sobre a existência de X; idealistas e conceitualistas negam que possamos afirmar que a existência de X é independente de nós; reducionistas negam que aquilo que é afirmado sobre X não é redutível a outras afirmações que possam ser de outra coisa senão X; instrumentalistas e projetivistas não entendem que seja possível atribuir caráter inequívoco à descrição de X de acordo com as condições de verdade para as afirmações acerca de X; e, por fim, os empiristas construtivos não acreditam que seja possível obter verdades acerca de X e que devemos crer completamente naquilo que é afirmado acerca de X.

E esta é somente uma forma de delimitar o debate. Haveria possibilidade de estender as discordâncias e os posicionamentos conflitantes, mas, optou-se por esta explicação, que foi parafraseada em boa parte de Simon Blackburn (vide referências).

Quanto aos argumentos filosóficos mais conhecidos relacionados ao assunto, destacam-se os argumentos da revelação, da transparência da experiência, do sonho cartesiano, do gênio maligno e do cérebro numa cuba.

O argumento da revelação, segundo o entendimento de Mark Johnson na “filosofia da cor” (há outros possíveis), sustenta basicamente que, se um sujeito X tem a sensação Y, e Y é uma sensação de Z, então, por revelação S conhecerá os traços essenciais de Z. Como o sujeito S tem essa sensação Y, então, sendo Y uma sensação de Z, S conhecerá os traços essenciais de Z.

Em uma abordagem semelhante, há o argumento da transparência da experiência, que foi canonicamente apresentado por Moore. Mas ele contesta a tese de que as sensações nos deixam diretamente conscientes dos aspectos das sensações ou experiências. Em uma das várias maneiras de demonstrá-lo, infere-se que, se um sujeito X tem uma sensação Y, Y é uma sensação de Z. Ao ter a sensação de Y, X tem apenas conhecimento direto de Y. Portanto, X é diretamente consciente de Y, mas somente poderá ser diretamente consciente de Z se Z for igual a Y.

Os argumentos do sonho e do gênio maligno foram escritos por Descartes. [1] O primeiro infere, basicamente, que não é possível distinguir entre sonhar e estar acordado, pois é possível que se sonhe que se está realizando um teste para verificar se se trata realmente de um sonho ou da realidade, e se pode concluir, em sonho, que não é o caso de se estar sonhando. Ao acordar, percebe-se que a conclusão derivada do teste feito em sonho era enganosa, mas não se pode dizer certamente que um novo teste, agora “acordado”, não será igualmente enganador.

No segundo argumento, Descartes faz a suposição de que pode haver um gênio maligno, muito poderoso, em alguma outra dimensão ou instância desconhecida, que nos controla e engana a toda hora. Ele pode produzir todas as nossas sensações, orientar nossos pensamentos da maneira como bem quiser. Se alguém argumenta que ele não existe e fornece bons motivos para acreditarmos nisso, pode-se dizer, por exemplo, que não há nada que prove que esse alguém não tenha sido levado a fazer isso pelo próprio gênio maligno. Uma versão contemporânea do argumento foi formulada por Hilary Putnam, em que o gênio maligno é substituído por um cientista que controla o cérebro do sujeito. O cérebro que pensa que percebe a realidade está em uma cuba com os nutrientes necessários para mantê-lo vivo e a tecnologia necessária para criar as ilusões que ele tem sobre a realidade. Da mesma forma que na hipótese do gênio maligno, aparentemente não há como provar que o cientista e o nosso cérebro numa cuba não existem. Para cada nova prova ou novo argumento, se poderá alegar que não passa de mais uma ilusão projetada em nossa mente pelo cientista.

Numa tentativa de amenizar as consequências dos problemas metafísicos citados acima, podemos considerar propostas alternativas, como a de Quine. Quine argumentou a favor de uma epistemologia naturalizada, que entende que não há melhores padrões de justificação disponíveis entre derivação formal e os padrões da própria ciência empírica e, como não há padrões melhores de justificação disponíveis, então a epistemologia deveria recorrer à própria ciência para justificar práticas e resultados científicos. Sendo verdade ou não que estamos sendo controlados por alguma coisa poderosa de algum outro lugar, não parece haver como demonstrar nenhuma das hipóteses. Assim sendo, dado aquilo que podemos conhecer, ou podemos pensar conhecer, parece ser prudente utilizar os métodos da ciência para justificar nossas crenças e desenvolver a explicação dos mecanismos causais responsáveis pelo desenvolvimento das ciências.

Referências
BARBONE, S; BRUCE, M. Just the arguments: 100 of the most important arguments in western philosophy. Blackwell, 2011.

BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de Filosofia. Lisboa: Gradiva, 1996.

POLONIO, Artur. O fundacionalismo de Descartes. Disponível em: http://criticanarede.com/epi_descartes2. html. Acesso em: 22/05/2014.

VAZ, Faustino. René Descartes e David Hume. http://criticanarede.com/hist_descarteshume.html. Acesso em: 22/05/2014.




[1] Curiosidade: O objetivo dos argumentos do sonho, do gênio maligno e do cérebro numa cuba, de mostrar as fragilidades que temos para definir aquilo que é real, parece ter antecessores antigos. Vale pesquisar mais sobre a Alegoria da Caverna, de Platão (que sugere uma reflexão sobre a aparência das coisas), a Ilusão de Maya, do budismo; e O sonho de Zhuangzi, de Zhuangzi (que foi popularizado, no Brasil, pela música “Sábio chinês”, de Raul Seixas). 

28 comentários:

  1. Caros autores, parabéns pelo texto. Tenho aqui algumas objeções, se me permitem. Pelo que pude entender os amigos argumentam que por não haver como demonstrar se estamos ou não, sendo sistematicamente iludidos (por demônios, cubas ou estados oníricos) então ou declaramos falência cognitiva ou -- e ainda não entendi como isto sanaria o problema -- temos de recorrer a métodos empíricos para solucionar problemas metafísicos.

    Não posso demonstrar que não estou sonhado enquanto lhes escrevo esse post, mas não vejo nenhuma boa razão para pensar que estou a sonhar agora. Como também não vejo nenhuma boa razão para não me levantar da cama só porque não posso provar matematicamente que há um chão sob meus pés. Com isto quero chamar a atenção para o fato de que não precisamos de razões apenas para acreditar, mas também para duvidar. Duvidar de x simplesmente pelo fato de ser possível duvidar seja do que for, é tão carente de justificação quando acreditar dogmaticamente seja no que for. E o fato de não haver procedimentos de prova infalíveis para demonstrarmos que não estamos sendo sistematicamente iludidos não torna esse ceticismo hiperbólico menos disparatado. O ponto é que, não ser uma falsidade lógica não é per se indicativo de plausibilidade.

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  2. Outro ponto importante é que a crença de que só os procedimentos da ciência empírica nos poderão livrar dessas “dúvidas” falha por um aspecto bastante sutil, mas crucial. É que a epistemologia naturalizada nada tem de naturalizada. É “filosofia de poltrona” como qualquer outra. O argumento de Quine, de que a epistemologia deve recorrer aos resultados da ciência não obedece a seu próprio critério. Isto é, não se trata de um argumento baseado em métodos empíricos e dados observacionais. É um argumento a priori. É como ser um egípcio e dizer que só os gregos dizem a verdade. Ocorre que o “naturalismo” de Quine (quiçá o naturalismo como um todo) não é mais que uma reedição algo sofisticada do cientificismo; a tese esdrúxula de que ou determinada área de investigação é capaz de empírica e algoritimicamente solucionar as questões de seu interesse, ou que então seja deitada fora. Em vista disso, penso eu, nem a epistemologia naturalizada tem poder de dissipar dúvidas hiperbólicas (visto ser autofágica) nem tal gênero de dúvida é algo à se levar a sério.

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  3. Eis dois interessantes textos de Timothy Williamnson sobre o naturalismo.


    http://opinionator.blogs.nytimes.com/2011/09/04/what-is-naturalism/?_php=true&_type=blogs&_r=0

    http://opinionator.blogs.nytimes.com/2011/09/28/on-ducking-challenges-to-naturalism/

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  4. Marcos Vinicius, agradeço pelos comentários. Foram bastante pertinentes para deixar algumas coisas mais claras. Apesar de que, vale lembrar, é um texto meramente introdutório e não buscamos concluir coisa alguma com os argumentos que foram vagamente apresentados, tampouco defender um ou outro. Não é um trabalho propriamente filosófico, somente explanamos acerca dos principais posicionamentos filosóficos e pretendemos fornecer algumas posições a respeito do tema, para o público não especializado que visita o blog compreender um pouco as posturas mais comumente adotadas para tratar do assunto e para o público especializado fazer ponderações e críticas (como você está fazendo).
    Quanto ao seu primeiro ponto: não se trata de termos defendido que ou devemos declarar falência cognitiva ou que temos que recorrer a métodos empíricos para solucionar problemas metafísicos. O leitor pode vir a concluir pela primeira ou segunda opção (ambas acompanhadas de uma série de desafios e problemas). Mas não defendemos que se deve optar por uma ou outra, ou que a primeira poderia sanar o problema ou ainda que a segunda defende que devemos recorrer a métodos empíricos para solucionar problemas metafísicos. Algo que pode ter realmente passado despercebido e que mereceria explicação no texto é o Trilema de Agripo, que, aliado aos problemas metafísicos expostos, parece ter íntima relação com seu comentário a respeito da falência cognitiva. Mas, para que pudéssemos fornecer algum tipo de informação básica para o debate acerca deste problema deveríamos ter tratado ao menos das teorias fundacionista, coerentista e infinitista, para contrastá-las com o ceticismo, o que tornaria o texto muito extenso e, infelizmente, afastaria os visitantes pouco habituados com a leitura.
    No seu segundo ponto, parece haver uma boa explicação para tentar resolver o problema. Parece-me um posicionamento bastante pragmático. Entretanto, algumas objeções parecem possíveis. Quando você não vê problemas em levantar da cama mesmo sem poder provar matematicamente que há um chão sob seus pés, você não possui justificação matemática, mas possui justificação empírica que, no decorrer da história, tem se mostrado bastante eficiente. Não é necessário fazer prova matemática para se justificar uma ação corriqueira se a experiência já demonstrou que há o chão, independentemente de ele ser uma ilusão projetada pelo gênio maligno ou não (estou falando aqui de qualquer pessoa, e não de um filósofo preocupado com o assunto com medo de não encontrar o chão). Acredito que o problema em questão não está aqui relacionado ao que eu julgo justificar X ou Y, mas sim se os objetos de minha justificação e os objetos de minhas crenças são mesmo reais.
    Quanto ao julgamento do ceticismo como disparatado, acredito que tendemos todos a crer nisso, em maior ou menor grau. Entretanto, isso não muda o fato de que parece que ainda não temos os tais procedimentos de prova infalíveis para demonstrarmos que não estamos sendo sistematicamente iludidos, que dariam fim ao ceticismo. Qualquer cético poderia dizer: “Que razões há para crer que o gênio maligno não lhe induziu para que você assim pensasse?”. Por mais disparatado que possamos achar tal pensamento, a dúvida parece pertinente, pois mostra claramente a fragilidade de muito daquilo que pensamos e afirmamos, pois parece que só podemos afirmar que achamos disparatado. Um cético também poderia questionar “que motivos há para assumirmos que tal posicionamento é disparatado?”. Parece que qualquer resposta dada às duas perguntas deste parágrafo leva aos problemas clássicos do Trilema de Agripo: regresso ao infinito ou circularidade viciosa ou parada arbitrária. Portanto, por mais que estejamos dispostos a presumir certas crenças como verdadeiras, as questões levantadas pelos céticos me parecem questões de difícil solução que merecem consideração, ainda que possamos considerá-las, por vezes, disparatadas.
    Quanto ao terceiro ponto, eu não faria objeções. Eu mesmo faço constantemente críticas similares.

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  5. Fiquei em dúvida: você criticou a visão cética e também criticou a visão naturalizada. Seu ponto crucial parece ser uma crítica às dúvidas hiperbólicas (me perdoe se eu estiver equivocado). Mas, de que maneira você consegue propor algum argumento para fugir das dúvidas hiperbólicas? De que maneira elas são autofágicas? Qual o seu posicionamento sobre o assunto (ou qual corrente você acredita que responde ao problema em questão)?

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  6. Obrigado pelas respostas Mickhael Bachmann. Vou tentar responder aos comentários e indagações que colocou...

    “Quando você não vê problemas em levantar da cama mesmo sem poder provar matematicamente que há um chão sob seus pés, você não possui justificação matemática, mas possui justificação empírica”

    Por “prova matemática” apenas quis dizer “prova absoluta, infalível”. Mas seja como for, nem provas matemáticas nem provas empíricas bastam ao cético. Assim, o que a nós parece uma ótima justificativa para levantar da cama, ao cético não é suficiente. Vocês mesmos apontam para esse problema: “Para cada nova prova ou novo argumento, se poderá alegar que não passa de mais uma ilusão projetada em nossa mente pelo cientista.”
    E essa atitude radical do ceticismo também interdita a idéia de que uma epistemologia naturalizada poderia sanar ou amenizar dúvidas radicais, por isso não ficou claro a mim porque a proposta de Quine pode ser vista como uma alternativa para amenizar o problema.

    “parece que ainda não temos os tais procedimentos de prova infalíveis para demonstrarmos que não estamos sendo sistematicamente iludidos, que dariam fim ao ceticismo.”

    Mas esse é o ponto. Por que precisamos de provas infalíveis para justificar nossas crenças? É esta idéia, de que só podemos nos sentir cognitivamente satisfeitos depois de provas últimas e absolutas, que é injustificada. Parece-me que somente positivistas, pirrônicos e absolutistas acham razoável requerer esse tipo de prova.

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  7. “Um cético também poderia questionar “que motivos há para assumirmos que tal posicionamento é disparatado?”.

    Temos aqui um ponto crucial. O que o cético faz é uma inversão de ônus. Costuma-se pensar que só quem crê é que tem o ônus da prova. Mas isto não é verdade. Se ponho em dúvida a existência do continente europeu e em seguida peço que me mostrem porque devo acreditar que aquele continente existe, estou invertendo o ônus da prova. Ora, não é meu interlocutor que tem de mostrar porque é razoável crer que ‘p’, mas sou eu, que coloco em dúvida algo evidente, quem deve mostrar porque tenho razão ao colocar ‘p’ em dúvida. Assim, o que se passa na mente de um cético é basicamente a ideia de que se não podemos rechaçar uma dúvida por algum procedimento de prova infalível, então teremos de considerá-la com seriedade. Todavia, o simples fato de não ser possível efetuar uma exclusão lógica e infalível de uma dúvida não é razão suficiente para se ter essa dúvida.

    Enquanto duvidar do que não nos parece evidente ou intuitivo é uma atitude epistemicamente sadia, duvidar sistematicamente de tudo apenas por ser possível fazê-lo, além de ser uma atitude epistemicamente gratuita é também incoerente, pois se nada há que justifique qualquer crença, então também o cético não tem justificação para crer que não há justificação para crer. O interessante é que a suspensão de todos os juízos, além de neutralizar a busca por conhecimento, depende ela mesma de um juízo. Além do mais (e evocando Russell), é sempre necessário um juízo para cada outro que se tome por injustificado. Assim, se o cético coloca em dúvida um crença é porque crê que não há razão para sustentá-la. Mas se para o cético não há justificação para qualquer crença como ele justifica a dele?

    Por fim, tentando responder às últimas questões que colocou, o que proponho em lugar de naturalismos e afins, é aquela atitude epistêmica que vem sendo colocado em prática desde os tempos de Platão e Aristóteles e que consiste na abertura à discussão intensa e cuidadosa de nossas idéias e na constante revisão de nossas crenças. A esta atitude podemos chamar ‘falibilismo’ e é o que melhor caracteriza os processos de justificação de nossas crenças. O método empírico é apenas mais uma forma de se fazer isso e é adequado apenas a certos gêneros de problema, quais sejam, aqueles que podem ser contrastados com dados observacionais, obviamente. Outros tipos de problema naturalmente exigiram outros métodos.

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  8. Queria ter dito "Outros tipos de problema naturalmente exigem outros métodos." :)

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  9. Caro Marcus Vinícius,

    Primeiramente gostaria de agradecer sua valorosa contribuição. Em segundo, reafirmar o dito do Mickhael que ele apresenta que este é um espaço aberto para filósofos profissionais e apreciadores da temática. Assim sendo, em diversos momentos teremos que ser mais didáticos e também aceitar a forma um pouco diferente dá apresentada por filósofos profissionais (de orientação mais analítica..OK!).

    Para apimentar um pouco mais esta discussão eu sempre fico um tanto quanto preocupado quando nossas investigações ficam demasiadamente preses nos labirintos da linguagem. OK, admito que também sou um apreciador do modo analítico de fazer filosofia (e ciência).... todavia, por vezes me parece que ficamos tempo demais apresentando os problemas causados por questões linguísticas e deixamos de lado de tentar solucionar outras questões também altamente relevantes...
    Atualmente o tema Realidade e Ficção anda permeando meus estudos acerca do problema da consciência. Mas, sinceramente, em diversos momentos prefiro utilizar alguns conceitos operacionais para poder avançar nas pesquisas... por mais que eu deteste o Husserl.... o uso de "algumas epoches" não me parece assim tão ruim em diversos momentos...

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  10. Caro Nivaldo...

    Obrigado pela resposta. Estou ciente do caráter introdutório e expositivo do texto. Não pretendi de início imputar posicionamentos a você e ao Mickhael, o que quis foi expandir o assunto do texto, puxando-o para regiões mais “periféricas” de modo a dar continuidade ao tema. Pelo que tenho notado, além de discussões mais descontraídas, por aqui também se discute aspectos mais “profundos”, por assim dizer, dos textos apresentados (não que minhas ponderações sejam lá muito profundas).

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  11. Voltando ao assunto... Ao menos não foi minha intenção lançar a discussão em labirintos linguísticos. O que pretendi foi discutir a coerência da dúvida “pirrônica” e do dito naturalismo. Note que não coloquei em xeque o ato sincero e cognitivamente virtuoso de colocar em dúvida aquilo que se nos apresenta pouco intuitivo, novo ou nada evidente. Aliás, sem um ceticismo firme e moderado não se pode realizar qualquer investigação séria, motivo pelo qual não vejo problemas em seus ‘epoches’. É salutar que procedamos assim em sua investigação. O que critiquei, na verdade, foram as dúvidas hiperbólicas, as quais julgo gratuitas e irracionais. Daí eu dizer que não só crenças, mas também as dúvidas não nos podem ocorrer a esmo, elas também carecem de justificação.

    Sobre o naturalismo, minha resistência a essa doutrina segue mais ou menos os passos dos textos do Williamnson que indiquei acima. Na verdade, acredito que ao final das contas o naturalismo não passe de um modismo passageiro, como o positivismo e a “virada linguística”. É mais uma das tantas tendências “heróicas” que pretendem resolver todos os problemas intelectuais de uma vês por todas, com um só método e a um só golpe.

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  12. Caro Marcus Vinícius, Caso deseje conhecer um pouco mais sobre nossas pesquisas podes entrar em contato comigo: nivaldo@unidavi.edu.br - sempre temos as portas abertas para novos pesquisadores de outras universidades nacionais e internacionais...OK! Se pudres mandar também o link para teu currículum lattes, isso sempre interessa!

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  13. continuando... Marcus, quanto aos teu dizeres "... na verdade, foram as dúvidas hiperbólicas, as quais julgo gratuitas e irracionais. Daí eu dizer que não só crenças, mas também as dúvidas não nos podem ocorrer a esmo, elas também carecem de justificação."

    CONCORDO PLENAMENTE!

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  14. Caro Nivaldo, desejo conhecer sim as pesquisas do grupo. Aliás, foi o Daniel Gontijo, um cara super gente fina, que me indicou esse blog e me falou sobre o grupo de vocês. Pode deixar que vou mandar sim as informações que pediu, abraço!

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  15. Marcus Vinicius,

    Concordo com boa parte dos seus comentários e vejo neles boa parte da discussão que foi deixada de fora do artigo para não torná-lo muito extenso. A única parte que discordaria um pouco é na crítica ao ceticismo pirrônico, em especial quando tratas da questão da justificação das dúvidas. Nesta parte, basicamente dois tipos de céticos poderiam ser apresentados com propostas diferentes: o cético pirrônico, que busca atacar a tese em disputa visando reduzi-la a uma posição absurda e, o cético acadêmico, que busca defender uma tese (algo como “não é possível saber que p”). Você diz que sua proposta visa discutir a coerência do cético pirrônico. Neste sentido, em uma discussão com um cético pirrônico, o cético lhe faria sempre questionamentos sobre a fonte de justificação de suas crenças e você poderia sempre apontar o mesmo defeito na argumentação (a inexistência de justificação para as dúvidas). Parece que pedir para o cético que exponha as justificativas para as suas dúvidas possa ser uma estratégia interessante. O problema é que o cético pirrônico costuma responder sempre com uma nova pergunta (não sei precisar se é regra, mas costuma acontecer). Ou seja, sempre que indagado sobre quais os motivos de sua crença em p, perguntaria quais os motivos da pergunta feita sobre a crença dele em p. Caso contrário, se fornecesse uma resposta, levantaria uma tese e se tornaria um cético acadêmico. Acredito que, para o cético pirrônico, nem mesmo essa pergunta possa lhe causar desconforto, pois a resposta seria uma nova pergunta.
    Obviamente, o ceticismo pirrônico parece ser somente uma estratégia. Não creio que poderia haver um cético pirrônico, pois ele nada poderia fazer além de duvidar de tudo. Antes de dar um passo precisaria perguntar que motivos há para dar um passo, e, por não poder defender teses, questionaria eternamente e não andaria jamais. Se bem que, acredito que ele me perguntaria que motivos tenho para pensar assim...hehe.

    Abraços!

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  16. Marcus,

    O Daniel além de um ótimo roqueiro...tem uma habilidade intelectual invejável! Espero poder contar com ele como professor em cursos de pós-graduação...

    Uma indicação dele já basta para que eu aceite você em nosso grupo de pesquisa...

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  17. Mickhael e Marcus,

    Já fui um grande admirador (e ainda sou) de discussões acerca de questões como o ceticismo. Todavia, atualmente prefiro utilizar do ceticismo (pirrônico) e da Virtude intelectual como critérios metodológicos na forma de proceder da atividade intelectual.
    Na verdade, os que já me acompanham mais de perto a algum tempo notaram que eu não sou muito adepto aos critérios tão rigorosos de demarcação entre ciência e filosofia. Prefiro muito mais uma preocupação rigorosamente e frutiferamente apresentada...OK!


    PS: Esse frutiferamente ...até eu me emocionei com o termo! kkkkk

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  18. Nivaldo...


    Também não aprecio essas tentativas de se obter demarcações rigorosas entre filosofia e ciência. Penso ser científica toda a atividade intelectual epistemologicamente séria, isto é, que lança mão de procedimentos rigorosos para gerar conclusões justificadas acerca dos problemas que lhes são propostos. Assim, a diferença entre a filosofia e a física encontra-se, a meu ver, mais nos tipos de métodos do que no rigor científico. Portanto, o que vai determinar se um método é científico não é ele ser empírico, mas se é epistemicamente adequado para lidar com o gênero de problema escolhido. Daí a minha relutância ao naturalismo, que pensa que ciência empírica esgota tudo o que se pode chamar de ciência. Nesse caso, até a matemática e a lógica não seriam científicas já que não são empíricas, mas formais.

    ... Daniel é um cara muito inteligente mesmo, tem cacife pra lecionar em nível de pós-graduação com certeza. A propósito, também sou roqueiro e guitarrista como ele kkk.
    P.S; Mandei o meu currículo como me pediu. Fico muito agradecido.

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  19. Mickhael...

    Que o cético pode nos pedir razões ad infinitum não está em discussão, o que conta é que ele não tem razão para proceder assim, e isto é suficiente para rejeitar esse tipo de posição. Isto é, não é importante se o cético radical pode duvidar indefinidamente, basta que não tenha razão para isso. Um ponto que acredito estarmos em acordo é quanto a inexistência desse tipo de cético, mesmo porque no limite uma tal pessoa não poderia sequer ser portadora de crenças. Assim sendo, embora esse ceticismo seja uma possibilidade gramatical, é certamente uma impossibilidade psicológica (o próprio Descartes disse coisa parecida nas ‘Meditações’). Talvez o ponto de nossa divergência seja que no meu entender, esse tipo de ceticismo não é resultado de uma legítima virtude filosófica e questionadora, não é fruto de genuína precaução intelectual. É apenas resultado de podemos usar a gramática para criar labirintos linguísticos (para usar uma expressão do Nivaldo). Entretanto, desconfio que para você o valor do ceticismo radical seja apenas heurístico, no sentido de testar os limites de nossos procedimentos de justificação. Nesse caso, acredito não haver grandes problemas, embora seja discutível se esse ceticismo exagerado seja mesmo heuristicamente útil.

    De qualquer forma, supondo que os céticos radicais reivindiquem a razão, isso não será obtido facilmente. Nos termos que colocou, um cético acadêmico “acredita” ser impossível saber que “p”. Mas ainda que fosse impossível saber que ‘p’, disso não se segue que não exista justificação para crer que ‘p’. O problema com o cético acadêmico, é que pressupõe uma noção ‘alética’ de justificação, no sentido de que uma boa justificação deveria implicar a verdade da crença. Mas o elemento alético do conhecimento é a verdade, não a justificação; esta é um elemento meramente epistêmico e portanto suas condições de satisfação não necessitam extrapolar o âmbito dos procedimentos tipicamente razoáveis de geração de crenças. Assim, estar justificado em crer que ‘p’ não implica a verdade de ‘p’. Por outras palavras, podemos ter razões para crer que ‘p’ mesmo que ‘p’ não seja o caso.

    Claro, isso deixa margem para o cético defender, que seja como for, todas as nossas crenças podem ser falsas (mesmo aquelas justificadas). Mas esse problema também é contornável. Falo disso mais adiante para não alongar demais esse post.

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  20. Os séculos passam e Descartes ainda não nos deixa dormir em paz. Suas obras nos fazem perceber constantemente como nossos conceitos de realidade e verdade são efemeros. Ele faz a “destruição” de tudo aquilo que tomamos como princípios absolutos. Esse é o objetivo de sua filosofia. Na primeira meditação, Descartes dedica-se quase que inteiramente às dúvidas, razão pela qual essa primeira parte de sua obra é apresentada como a parte da dúvida hiporbólica (mais especificamente a questão do gênio maligno), como muito bem foi lembrado.

    Contudo, Descartes não se restringe á primeira meditação. Avançando em sua obra, Descartes inicia, a partir do final da segunda meditação, a parte construtiva de sua obra. Já que tudo o que restou do inquérito filosófico foi a dúvida, como então estebelecer algo como verdadeiro. É aqui que entra o tão conhecido “penso, logo existo”.

    Adentrando mais especificamente na temática do texto, Descartes era um matemático. Ao estudar matemática depara-se com a obra Elementos de Euclides e toma conhecimento do método ou modelo axiomático. Sendo assim, tirando o clássico exemplo de que não é correto confiar na matemática pois não sabemos qual o último e o primeiro número, porque que não atribuir um pouco de veracidade a uma ciência que preza pela precisão e reprodução dos dados obtidos?

    Como foi comentado, em determinadas situações é necessário estabelecer alguma proposição como verdadeira ou pelo menos aceitável para que não fiquemos em uma redução eterna. Por que não, ao assumirmos tal proposição como verdadeira, não nos utilizamos das ciências matemáticas?

    No que se refere ao ceticismo pirrônico, como já comentei algumas vezes aqui no blog, esta me parece uma posição um pouco “fácil” de ser defendida. Não sei até que ponto é a postura a ser adotada para o enfrentamento de problámaticas no âmbito da epistemologia. Recorrer ao ceticismo por vezes é necessário e muitas vezes trás melhores argumentações e proporciona um refinamento do saber, porém, acredito que utilizado em demasia o ceticismo nos conforta em não procurar soluções ou alternativas de procedimento.

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  21. Essa questão referente ao ceticismo pirrônico, ou ser dogmático em relação a certas verdades, certamente é um grande problema a ser enfrentado em relação as definições de realidade x ficção. Como o colega Elizeu comentou sobre a construção de Descartes "Penso, logo existo" poderia-se discutir demasiadamente a veracidade desse conteúdo de pensar... porém, concordo com você quando defende que é necessário ter algum ponto que se estabeleça como verdade, a fim de traçar um objetivo e caminho a seguir.

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  22. Marcus Vinicius, acredito que não estamos discordando. Eu não pretendia defender o ceticismo, só tinha me empolgado com o debate mesmo hehehe

    Abraços!

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  23. Elizeu, realmente, adotar um procedimento pirrônico sem limites parece ser nada produtivo, não só na epistemologia, mas em qualquer área. Porém, como você mesmo disse, utilizá-lo como uma das ferramentas para verificar as fragilidades do estudo parece ser muito interessante.

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  24. Mickhael E. A. Bachmann, como já disse em outro post, não estava lhe atribuindo esse ceticismo. Estava apenas discutindo aspectos desse tama junto contigo, nos empolgamos juntos com esse debate hahaha!

    Abraços.

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  25. Muito bom o texto, adoro as discussões que questionam a realidade! Sempre fico me perguntando sobre isso, será que é tudo uma grande farsa?! Parabéns pelo texto!!
    Queria aproveitar para deixar aqui meu link, um blog que científico com um caráter também filosófico, http://talesciencia.blogspot.com.br/
    Valeu galerinha!

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  26. sou infinitista não porque a realidade é infinita em termos teologal e existencialmente em carater de TEMPO e ESPAÇO, mas sou realista naquilo que confere realidade mesmo com os adjuntos do irrealismo

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  27. Alguém aqui já teve contato com algum tipo de substância sagrada, como por exemplo a dimetiltriptamina???

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