4 de maio de 2016

CARO PSICÓLOGO: O QUE VOCÊ FAZ?

Há muitos anos enfrento situações no âmbito acadêmico que, por vezes várias, chegam a me deixar constrangido! Uma delas, sem a menor sombra de dúvidas, é a seguinte: “afinal, o que faz um psicólogo?”. Diante desta indagação aparentemente simplória se esconde um problema de difícil resolução.

Resolvi, então, tentar perguntar para pessoas das mais diversas formações o que elas achavam que era a psicologia e/ou o que elas pensavam que era o trabalho de um psicólogo. E, neste momento, uma preocupação ainda maior surgiu. Percebi que as respostas de pessoas com formações variadas eram tão desencontradas quanto as respostas dos profissionais da área de psicologia. E isso, como disse, me deixou profundamente preocupado!

Ora, mas o que fazer então se as pessoas que não possuem formação na área de psicologia possuírem compreensão divergente dá área em foco, tanto quanto, os próprios ditos entendidos no assunto? Em quem confiar? Qual o rigor necessário para podermos dar credibilidade à tese “X” em detrimento da tese “Y”, em relação ao objeto e ao trabalho do psicólogo?

Pensando nestas inquietações, resolvi trazer para o público geral interessado pela temática, um espaço para que profissionais da área de Psicologia e curiosos acerca da questão possam apresentar seus respectivos pareceres.

Uma boa discussão...
Nivaldo Machado

9 comentários:

  1. Entendo o trabalho do psicólogo, de forma geral, mas não para todo caso específico, provavelmente, da seguinte forma: Considere um dos princípios gerais do funcionamento do cérebro aquele segundo o qual planos de interação cujo sucesso se repete varias vezes são postos em atividade automaticamente. Isso refere-se existência de padrões fixos de ação, encontrados provavelmente no cerebelo e em regiões do lóbulo temporal. Esse é um mal necessário, por assim, dizer, tendo em vista que o cérebro gasta muita energia decodificando a cada instante nova informação e criando, no lóbulo frontal, estratégias de interação motora. Para tanto, o sistema assume que, dado um coeficiente de feedback positivo, uma tal estratégia se torna um padrão fixo de interação - dado o estímulo lá vou eu agir daquela forma (note que há muito ruído no cérebro o que dá margem para uma certa liberdade no agir).
    Agora, pois bem, o entorno ao nosso redor muda. Mudam as pessoas e suas relações. Assim, um padrão fixo de ação pode mudar de um coeficiente positivo para um negativo - em vez de disparar recompensa, passa a disparar punição (tristeza, dor, etc). O lóbulo frontal, cuja função consiste em planejamento, mas não processamento da informação sensorial, tenta "explicar" o que está ocorrendo - eis que temos a neurose.
    Pois bem, a tarefa do psicólogo me parece essa de auxiliar o sistema a recodificar (ou ressignitificar, como eles preferem) essa informação vinda de setores inconscientes do cérebro. Tarefa essa que não se pode fazer sozinho, tanto quando não é tarefa do lóbulo frontal integração sensorial, mas apenas planejamento dada a informação acerca do entorno.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Este comentário foi removido pelo autor.

      Excluir
    2. Márlon,

      Achei muito interessante sua explicação neurocientífica do objeto de trabalho do psicólogo.

      A única dúvida: setores inconscientes do cérebro?

      Excluir
  2. Sou apenas um acadêmico, no entanto o que vejo neste âmbito são "mestres" e "doutores" que seguem cartilhas postas pelo CFP, de tal forma que moldam as conexões sinápticas dos pobres acadêmicos passivos de informação. Sem que estes venham a discutir se estas são de grande validade, ou são apenas informações de cunho ideológico (até mesmo partidário?) que estão sendo "vendidas" em grande escala para a padronização de discursos (estes sem vinculo com o ato de raciocinar) que entram em questão nas salas de aula. Salvo alguns destes que utilizam da maiêutica, ou de outros meios, com finalidade de impedir o descaso sobre as temáticas inicialmente abordadas em determinadas disciplinas.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Caro "anônimo".... parece que você está então preocupado com o excessivo viés político e ideológico que perpassam o fazer e a formação do psicólogo?

      Excluir
  3. Márlom,

    Creio que fizeste uma das melhores descrições acerca do trabalho que, em tese, o psicólogo deveria fazer!
    Todavia, sabendo que você não é um psicólogo de formação, acabaste apresentando, por mais que eu concorde e admire tua perspectiva, um detalhamento do fazer do psicólogo que eu ainda não havia encontrado entre os próprios psicólogos!
    Ora...
    A quem devo seguir... será eu filósofos da mente, da informação e da matemática como é o seu caso são os profissionais que sabem o que é o fazer do psicólogo?

    ResponderExcluir
  4. Nivaldo,

    Primeiramente agradeço você pelas importantes reflexões propiciadas entorno da minha área de atuação. Certamente, também são por meio destas, que ocorrem os progressos.

    Em relação ao que o psicólogo faz, realmente não consigo enquanto psicóloga responder tal pergunta de forma tão direta e óbvia, como no entanto deveria ser. Mas posso fazer algumas colocações a respeito.

    a) Acredito que um dos grandes problemas entorno da dificuldade de estabelecimento de objeto na Psicologia, consiste no distanciamento gritante entre as abordagens, visto que, cada um acaba definindo o trabalho do psicólogo com suas terminologias próprias.
    b) Visto que as terminologias são de cunho técnico específico de cada abordagem, bem como, a quantidade atual de abordagens teóricas e práticas utilizadas dentro da psicologia, não acredito ser possível chegar-se a uma definição geral e objetiva do trabalho do psicólogo que independa da abordagem utilizada, e que abarque toda a psicologia (veja, não estou afirmando que isso seja positivo, apenas retratando o que observo dentro da área).
    c) Pois bem, visto que a abordagem que escolhi para minha atuação clínica consiste na Terapia Cognitivo-Comportamental - que tem como alvo principal a forma como o individuo interpreta os fatos, visto que estes influenciam a forma como ele se sente e se comporta, sendo que quando tal interpretação ocorre de forma disfuncional causando sofrimento/ transtornos mentais - meu trabalho está fundamentado em três pressupostos fundamentais: (i) Auxiliar no processo de clarificação de como a atividade cognitiva do indivíduo está influenciando seus comportamentos; (ii) Trabalhar a mudança cognitiva, a fim de propiciar pensamentos e, (iii) consequentemente, comportamentos funcionais;
    Ou seja, o que eu faço enquanto psicóloga é trabalhar na identificação cognitiva de cada indivíduo e na reestruturação cognitiva desta.
    d) Por mais que eu concorde e me cobro constantemente acerca dos problemas entorno da psicologia, atualmente, com base na minha atuação prática, consigo notar eficácia na abordagem que utilizo, no sentido de que, é visível que alguém em sofrimento psicológico, consegue a partir da identificação daquilo que está cognitivamente disfuncional, reestruturar a forma como interpreta os eventos e pensar e se comportar posteriormente de forma funcional, melhorando seu bem-estar e diminuindo, quando não cessando os sofrimentos anteriormente experienciados.
    e) O grande desafio ao meu ver da abordagem cognitivo-comportamental atualmente, consiste em compreender de forma mais aprofundada como os mecanismos cerebrais afetam, geram ou contribuem para a formação das cognições disfuncionais, porém, já é notório esforços significativos nessa direção.
    f) Como mencionei no início, acho fundamental as críticas entorno da psicologia, e inclusive compartilho de muitos, porém, acredito que mais uma área deveria ao menos ser incluída em partes na mesma crítica, qual seja, a psiquiatria, porque também me gera algumas dúvidas... Qual o objeto de trabalho do psiquiatra? É possível apenas com medicação tratar de um transtorno? E medicação + terapia, será a melhor saída?

    ResponderExcluir
  5. Nivaldo, não me sinto confortável para afirmar categoricamente algo sobre a área da psicologia, muito me falta para fazê-lo com a propriedade do Marlon ou da Natanna. Portanto farei uma pergunta. O problema de tal definição não estaria talvez na dificuldade de encontrar um consenso para a definição do objeto de estudo, o inconsciente, e qual a influencia da "terapia psicológica" nesse? Pelo que vi dos métodos e vertentes é frequente o uso da palavra "inconsciente" com poucas definições claras oferecidas e entre as oferecidas há dissonância. A neurociência tem uma forma de ver o Inconsciente, o Lacanismo outra e por ai vai. Talvez analisar os conceitos de "inconsciente" presente nas principais áreas da psicologia e tentar abstrair semelhanças conceituais ou averiguar quais bases empíricas existem e sustentam cada uma das linhas e a partir disso chegar a uma conclusão geral. Talvez esse seja um bom guia para entender o problema.

    ResponderExcluir
  6. Eduardo,

    Sua preocupação é pertinente. De fato, existe uma confusão gigantesca destro da própria psicologia acerca do que ela seja!
    Mas, para auxiliá-lo (ou complicá-lo): como transpor essa aparente barreira que existe entre o consciente e o inconsciente? Note, grosso modo, parece que quando estamos conscientes estamos juntamente numa situação contrária (ou, pelo menos, muito próximo disso) em relação ao inconsciente. Se assim for, parece que algumas breves dúvidas terão que ser respondidas anteriormente:
    a) O que é consciência;
    b) O que é inconsciência;
    c) Existe relação entre elas? Se sim, qual e como se dá?
    d) É possível fazer ciência empírica com dados inconscientes?

    Creio que tais questões já sirvam para um início de conversa...

    ResponderExcluir

Bem-vindo à discussão!