14 de julho de 2015

Fatalismo e Metafísica

Na próxima reunião do Grupo de Pesquisa Filosofia da Mente e Ciências Cognitivas/CNPq vou apresentar uma brevíssima introdução à metafísica a partir de um dos problemas estudados nesta disciplina. O problema do fatalismo, também conhecido como problema dos futuros contingentes, é um problema genuinamente metafísico. Sendo assim, seu estudo está diretamente relacionado com o estudo dos principais argumentos filosóficos à favor e contra a tese fatalista. 

De maneira intuitiva, a tese pode ser caracterizada da seguinte maneira: se um evento P ocorrerá, então ocorrerá de maneira inescapável. Aqui nos deparamos com vários pontos a esclarecer a fim de alcançar algum progresso na compreensão do problema. O que é um evento? O que significa um evento ocorrer de maneira inescapável? Como defender esta tese?

Na apresentação buscarei esclarecer tais questões, além de apresentar e discutir com os interessados uma reconstrução de um dos principais argumentos a favor da tese fatalista, o argumento da batalha naval.

O estudo a sério deste problema, como de qualquer outro em filosofia, está relacionado de maneira bastante íntima com o conhecimento de lógica, clássica e não-clássica. É de fundamental importância a quem quer estudar um problema filosófico saber isolá-lo de problemas secundários, bem como apresentá-lo da maneira mais rigorosa possível. Só assim podemos pensar com clareza em uma resposta ao problema. O estudo da lógica aplicada à filosofia nos proporciona o treino dessas habilidades. É assim essencial aos interessados no estudo a sério de um problema filosófico, o conhecimento básico de lógica e de argumentação.

Uma boa discussão a todos!
Eduardo Benkendorf

28 comentários:

  1. Para começar..... só lembrando que o Argumento de Aristóteles supra citado diz que: "O argumento da batalha naval apresenta que quando as proposições ou os enunciados são verdadeiros, acontecerá o que os mesmos declararam.".

    “Se o destino para ti é convalescer desta doença, quer tu tenhas consultado um médico
    quer não tenhas consultado um médico convalescerás; paralelamente, se o destino para ti
    é não convalescer desta doença, quer tenhas consultado um médico quer não tenhas
    consultado um médico não convalescerás – e um outro destino existe para ti: logo,
    consultar um médico é indiferente.” [Cícero, De Fato, XII – 28-29]

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  2. Eduardo Benkendorf, os meus parabéns por este assunto, que tanto está ao nosso redor em grande parte de nossas vidas. Ficamos as vezes observando algumas prisões mentais que são de ordem genética, emocional, ou comportamental, cada qual determinadas seja por fenótipo ou genótipo.
    A famosa liberdade parece que é oque procuramos, e certamente é um assunto que escorre para sua presentação. um grande Abraço.

    Edson Stofela

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  3. Não tenho conhecimentos suficientes acerca da temática e provavelmente não vou auxiliar o Eduardo no que se refere a isolar os problemas filosóficos de problemas secundários. HAHAHAHA
    Mas, vamos lá.
    Caracterizando o fatalismo com a tese de que “se um evento P ocorrerá, ocorrerá de maneira inescapável”, como fica a questão da responsabilidade e livre arbítrio do indivíduo diante desse evento? Se um evento irá ocorrer de qualquer forma, seja por uma força divina ou qualquer outro arranjo, não me pareceria correto atribuir responsabilidade ao indivíduo assim como dizer que os seres humanos possuem livre arbítrio.

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    1. eu já disse para o Eduardo parar com essa coisa de chamar outras questões de secundárias pois aí está expresso seu mais profundo desdem pela demais áreas do saber (eaheaheahheaaeheah eu não poderia perder esta oportunidade Elizeu! kkkkkk)

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    2. Elizeu,

      Creio que também não exista uma implicação necessária para o caso que apontas em relação à responsabilidade. Vou tentar ser mais claro. Vamos admitir a tese do fatalismo de que um determinado evento P ocorrerá necessariamente no tempo T. Quanto ao livre arbítrio tenho a impressão, prima facie, de que ele estaria eliminado da possibilidade de ocorrência (pois implicaria numa contradição). Entretanto, a responsabilidade do Sujeito não está implicada necessariamente em relação à tese fatalista apresentada. Veja, posso considerar responsável o Agente do evento P em T de qualquer forma. Não existe contradição justamente por este ser um novo dado ao problema. Creio que eu teria problema se por acaso eu vinculasse a responsabilidade a possibilidade de mudança de efeito no evento P em T, ou seja, P em T seria variável e não determinada como preconiza a tese fatalista. Veja o exemplo admitindo a tese fatalista apresentada: Devido ao aparelho altamente sofisticado que consegue prever o futuro, estamos prendendo neste momento o futuro assassino de seu irmão, pois, "josé" SERÁ o RESPONSÁVEL pelo crime (note, não preciso admitir o livre arbítrio e nem mesmo a efetivação do evento para implicar a responsabilidade, OK! ah, mesmo que a prisão não evite o assassinato, ok...tendo em vista que o fatalismo irá garanti-lo!).

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    3. Olá Elizeu,

      a tarefa de isolar o problema que se está investigando de outros problemas secundários é algo essencial ao trabalho que buscamos fazer em filosofia. Tipicamente se entende por problema secundário aquele que não é o problema central que se está investigando. Não quer dizer que seja menos importante ou que seja supérfluo, apenas que não é nosso problema central. Se não soubermos separá-lo do problema central, gastamos nosso precioso tempo com ele ao invés de tratarmos do nosso problema em si.

      Com o treino você fica cada vez melhor nisso.

      No nosso caso, o problema que buscamos responder - e peço desculpa por não ter deixado isso claro no breve texto que escrevi - é o de saber se a tese fatalista, assim como você a caracterizou, é verdadeira ou falsa. Vamos analisar um argumento que busca defender tal tese e discutir se é ou não um bom argumento. (ps: não tenho uma resposta do tipo sim/não para isso).

      Por fim, mas não menos importante, os problemas que você aponta são muito interessantes, porém são problemas adicionais aos quais não tenho uma resposta e infelizmente não irei abordar na apresentação por serem mais complexos. Com certeza são bons problemas para uma outra apresentação!

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  4. Vamos caminhar mais um pouco... Eduardo, que tal os seguintes conceitos (provisórios é claro):

    a)O que é um evento?
    - Qualquer acontecimento que se dê em um determinado tempo e espaço.

    b) O que significa um evento ocorrer de maneira inescapável?
    - Que tal acontecimento, num tempo futuro, ocorrerá NECESSARIAMENTE.

    c) Como defender esta tese?
    - Creio que uma das melhores formas de defender esta tese seria: a) demonstrar a impossibilidade do livre-arbítrio; b) demonstrar que, pelo menos algumas cadeias causais, ocorrem necessariamente uma vez que forem começadas (ou seja, por exemplo: o evento A é causa de B, B é causa de C, C é causa de D. A ocorre no tempo 1 (t1) que implica a ocorrência de B em t2, que por sua vez implica na ocorrência de C em t3, que implicaria FATALMENTE na ocorrência de D em t4 - mesmo que D em t4 ainda não tenha ocorrido, ou seja, apenas tenha sido postulado como ocorrência necessária ainda não efetivada.

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    1. Bacana essa C nivaldo, a parte "b". Podemos trabalhar nisso aí. Só que ai a coisa fica mais difícil. Temos que dar as razões pelas quais deveríamos acreditar que essas cadeias causais são assim mesmo. E de que maneira isso dá suporte ao fatalismo.

      estou aberto a sugestões!

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  5. Nivaldo, antes que o lírio aprenda a absorver a energia solar por emio da fotossíntese, o sol não é a "causa" do lírio. Antes que Veneza aprendesse a boiar nas águas, a laguna não era um dos motivos de seu desenvolvimento. Causas e efeitos, como já pensou Whitehead, são apenas uma maneira retrospectiva de interpretar eventos. Em outras palavras, você está errado no item "C".

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    1. A coisa tá ficando bacana!

      Você está querendo defender o oposto do nivaldo no item C parte "b" que ele apresentou.
      Vou repetir o que disse a ele. Podemos investir nisso. Mas que razões temos para acreditar que isso é assim como você diz? por que razões ele está errado?
      Seria interessante mostrar que ainda que existam tais cadeiras causais como ele diz, isso em nada tem a ver com a verdade da tese fatalista.

      estou aberto a sugestões!

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  6. Jean, estou apenas dizendo que, quando for o caso da ocorrência da cadeia causal de A em B, B em C, C em FATALMENTE D, só isso! Veja, sem admitirmos a cadeia causal E admitirmos a tese fatalista de que C implicará em D necessariamente num tempo futuro (ainda não evidentemente ocorrido), nada o que disse faria sentido. Neste aspecto SE o Sol teria que ser a causa da fotossíntese do lírio NECESSARIAMENTE, pois, caso não, não teria a cadeia causal, e, por conseguinte, a perspectiva que adotei para postular acerca da tese fatalista deixaria de fazer sentido, OK!

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    1. Nesse caso, quando ocorre o evento A, que dá início à cadeia causal, necessariamente ocorrerá o evento D, que seria o "fim" da cadeia causal ou precisaríamos esperar que os eventos B e C causem o evento D?

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    2. Elizeu, Neste caso que apresentei os eventos B, C e D ocorrerão necessariamente após a existência de A como sendo causa primeira. Notar que o tempo em que tais eventos ocorrerão não interessa muito, todavia, poderei sempre dizer, neste caso, que A antecede B, B antecede C e C antecede D.

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  7. Eduardo,

    Não sei se consigo defender a tese fatalista. Creio que posso apenas, a partir de inferências probabilísticas, dizer que o evento D terá maior ou menos grau de probabilidade de ocorrência. Pois uma certeza necessária ainda não estou conseguindo encontrar um caminho que a garanta!

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  8. Probabilidade é a versão acadêmica da numerologia.

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    1. assim como a química pode ser entendida como a versão acadêmica da alquimia!

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  9. Mas Jean, como a probabilidade conseguiria convencer a si própria? Não entendi...

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  11. Nivaldo,
    Desculpe-me o modo como vou escrever, mas eu não sei pensar como um analítico e menos ainda escrever como um. Para mim, é curioso notar o quanto que a estatística e a probabilidade se tornaram quase unânimes como instrumentos de demonstração a partir do Renascimento - uma incursão na história das ciências vai mostrar que ela não figurava na lista de instrumentos/métodos antes desse período. Tudo certo isso, o cérebro vai fazer parte do discurso da filosofia no fim dos anos de 1940, que Gilbert Ryle. Não quero ser pejorativo ao dizer que ela foi uma "invenção de época". É parte do jogo considerar que invenções/descobertas, associações, passem a fazer parte do repertório de certas ciências, alterando, inclusive, alguns princípios (exemplo da mecânica para a relatividade). Aliás, a probabilidade aparece, justamente, associada à mecânica quântica e sua função de onda, e naquele momento, parece se tornar uma alternativa que destronaria as certezas mais cartesianas.
    Mas, a questão é que a probabilidade nunca conseguiu se desvencilhar da função subjetiva da interpretação - dos estados de crenças de cada um e, ao mesmo tempo, nunca se realizou plenamente em termos de objetividade, diante da frequência de fenômenos aleatórios. A sua relação com o cálculo dá a ela um status mais elevado, em aparência, do que a simples opinião. Mas para citar Joseph Butler (no seu l'Analogie de la Religion Naturelle et Révélée avec le Cours de la Nature, de 1736 - Ian Hacking também se remete a ele no livro L'Émerge de la Probabilité), "la probabilité est le guide même de la vie".
    Para além da maldade que o meu comentário, antes mal formulado, admito, suscitou entre os distintos Foucault e Malinowski, que comentam aí acima, dizer que a probabilidade é um guia da vida é algo muito sério. Significa que o resultado não é objetivo (no sentido da objetividade) ele é "o objetivo" no sentido daquilo que as pessoas buscam encontrar. A estatística e a probabilidade produzem um tipo de referência que acaba por definir a ação. Em outros termos, quem explicou isso muito melhor foi o Gustavo Leal-Toledo, naquele texto "Meta e Método", do livro que organizamos. A estatística e a probabilidade, tal qual a psicanálise por ele analisada, não servem como método, mas com meta. Se não é o psicanalista que "realiza a cura" por meio de seus métodos, mas o paciente que a produz por meta, o mesmo eu quero dizer da probabilidade pensada como "guide de la vie" - ela não traz o resultado, ela induz a sua produção. Em outros termos, a probabilidade não é muito mais do uma simples modelagem de opinião.
    Acho que soaria meio "bicho grilo" dizer isso, mas o Michel Foucault, que voltou de algum lugar para comentar aqui no seu blog, concordaria com isso: os números produzem uma relação de poder. Não concordo com a máxima popular de "os números não mentem". Isso é senso comum. Mas eu creio que "os números intimidam". A matemática é empoderada - são poucos os que desenvolvem habilidades para o seu tratamento - e nesse sentido, como há uma massa de analfabetos matemáticos - e eu me incluo nela, os números (estatísticos e de probabilidade) ganham a confiança popular e até mesmo acadêmica. Ela se torna aparentemente "incontestável", de onde de uma "modelagem de opinião" termina por desenvolver um status tão glamourouso como o de um método eficaz.
    Segundo o site da Caixa, se eu fizer uma única aposta da Mega Sena com 6 números, minha chance de ganhar é de 1: 50.000.000. Isso responde pela tese fatalista de que ao apostar, eu ganharei, inescapavelmente, na Mega Sena? Eu não vejo como o que tu chamastes de "grau de probabilidade de ocorrência"possa ser levado em conta para explicar a ocorrência de eventos futuros. O fatalismo, visto dessa forma, é literalmente uma loteria.

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  12. Jean,

    Quanto ao que apresentas em nível crítico quanto ao "poder" dado desmedidamente (por mais contraditório e penoso que pareça) à matemática, eu também concordo com você! Em MUITOS casos escondemos (e escondem) muito sujeira para debaixo do tapete matemático. Mas veja, acerca de ocorrência futura, me parece, que fica melhor eu confiar na probabilidade do que numa tese fatalista. Pelo menos eu apostaria mais na probabilidade em diversos casos, não todos é claro, em relação à tese fatalista. Creio que as teses fatalistas são passíveis de serem apresentadas, todavia, sempre (me parece) dependendo do tempo-futuro para sua demonstração/confirmação. Quanto ao Grau de probabilidade de ocorrência não é uma postura fatalista, pelo contrário, ela é apenas probabilística (tá certo que creio ser possível demonstrar algum "grau" de fatalismo na probabilidade talvez não em relação ao resultado do evento, mas sim, em relação a própria certeza do processo.... MAS ainda tenho que pensar muito para demonstrar isso, ok!).

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  13. ... e a probabilidade me dará maior ou menor garantia de ocorrência de um dado evento futuro, só isso. Mas, creio que ISSO seja algo bastante proveitoso em diversas circunstãncias (por exemplo: para evitar colisões entre aviões durante o voo!). Todavia, não consigo (ainda...rsrsrs) assegurar a fatalidade de que um evento ocorrerá APENAS com base probabilística (e no exemplo usado...seria uma fatalidade fatal! Lindo isso né! kkkkk)

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  14. Eduardo,

    Estou ansiosa por sua apresentação, pois vejo que a temática será muito interessante. Entretanto, não poderia deixar de realizar a seguinte pergunta:
    Em relação à Teoria do Caos, ela trata de fenômenos instáveis. Ela trata de sistemas deterministas, mas com um grau de imprevisibilidade. Assim, há uma determinação, sugerida inclusive por Laplace, mas que pode ser alvo de um "efeito borboleta" e ser drasticamente alterada, certo?
    Sendo assim, não deveria haver uma espécie de "gatilho" para que o que está determinado se altere? Essa saída da "inércia temporal" não poderia/deveria ser consequência de um fator externo como o livre-arbítrio, sustentando sua existência?

    ...ou será que devemos admitir que a aleatoriedade é inevitável e, nesse caso, está pré-determinado que algo indeterminado pode alterar o que está determinado? (esta frase ficou confusa, perdão, mas espero que seja possível entendê-la, rs)

    Me considero leiga no assunto, mas acho o mesmo interessante, e espero que sua apresentação possa trazer ainda mais "caos", haha!

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