24 de julho de 2008

É possível algoritmizar o mental?


Para termos uma idéia do que seja um algoritmo de compressão basta que imaginemos uma situação na qual queiramos escanear uma figura para, em seguida, tentar salva-la num disquete de 1,44MB. Se a figura for muito grande, ela não caberá no disquete e, não poderemos transportá-la para outro computador. Contudo é possível lançar mão de um artifício: compactar a figura para poder transportá-la em disquete, para em seguida, descompactá-la no computador de destino. Para compactar a figura usa-se um algoritmo de compressão. Ele diminui a figura temporariamente, identificando padrões ou regularidades que podem ser comprimidos ou compactados*

Dito de outra maneira, os algoritmos são procedimentos mecânicos para a solução de um problema matemático, cujas regras levam a uma solução. Nas palavras do filósofo da Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (Unidavi) Nivaldo Machado - que há algum tempo trabalha com a possibilidade de algoritmização do mental - um algoritmo é um processo formal composto de sucessivas etapas de prescrições que levam a determinado resultado sempre que ele for iniciado. Um algoritmo invariavelmente executa o que foi programado para executar. Isto, todavia, não impede que ele possa ser melhorado/adaptado com o passar do tempo.

Processos computacionais são facilmente algoritimizáveis. Mas seria possível também compactar padrões e regularidades no meu cérebro? Seria possível algoritmizar os eventos mentais, transformar meus processos cognitivos (desejos e crenças) em algoritmos?

Alguns críticos, como o filósofo Dreyfus da Universidade da Califórnia em Berkeley, alegam que a dificuldade está na criação de uma base de conhecimento suficientemente generalista, como a que possibilita os nossos processos cognitivos. O caso dos sistemas especialistas em diagnósticos médicos ilustra bem esse problema. Tais agentes inteligentes recebem a seguinte base: febre + dor de garganta = gripe. Eles então captam estímulos do ambiente (relato dos pacientes de febre e dor de garganta), consultam sua base de conhecimento e dão o diagnóstico de gripe.

Parece simples. O único problema é formular esta ampla base de conhecimento que consiste em descobrir e reunir todas as inúmeras informações que o sistema especialista necessita para dar um diagnóstico empiricamente adequado.

Essas questões motivam críticas e ressalvas ao desenvolvimento de uma máquina com a capacidade total de nossa mente. Para Machado, a possibilidade dessa algoritmização (branda) é clara. Obter os elementos para algoritmizá-la é que seria algo bem mais complicado.

* Este exemplo foi adaptado de Teixeira (2008)

Texto de Rafaela Sandrini
Edição de Luiz Paulo Juttel

7 de julho de 2008

Homem e (ou versus) máquina?

Neste post voltamos a falar da questão homem X máquina. Temos abaixo um brilhante comentário de Cristiano Castelfranchi, renomado pesquisador de inteligência artificial do Conselho Nacional de Pesquisa da Itália. O trecho adaptado foi extraído de entrevista para a edição de abril-maio-junho de 2008 da revista Ciência e Cultura.


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CeC: Professor Castelfranchi, existe a possibilidade de termos guerras contra máquinas racionalmente mais sofisticadas que os humanos?


Castelfranchi: Eu sou um pouco cético quanto à idéia da possibilidade real da evolução biológica das máquinas, da capacidade delas virem a se reproduzir, etc. Por outro lado, acredito que o perigo real e mais próximo seja a profecia Unabomber. Ela fala que no surgimento das máquinas artificialmente inteligentes, estas seriam totalmente dependentes às nossas decisões.

Mas, conforme nossa sociedade se tornasse mais e mais complexa e as máquinas ficassem mais e mais inteligentes, começaríamos a delegar a elas certas decisões. Isto ocorreria unicamente pelo fato das decisões das máquinas levarem a resultados melhores que os obtidos por decisões humanas. Eventualmente, chegaríamos a um momento que, de tantas decisões delegadas às máquinas, mesmo que tenhamos o poder de desligá-las, acabaríamos por levar nossa espécie ao suicídio se tentássemos algo desta espécie. Isto ocorreria por causa da nossa estrutura social incrivelmente complexa, de modo que apenas máquinas seriam cognitivamente capazes de geri-la.

Este cenário previsto por Unabomber já começa a se tornar realidade. Hoje temos muitos sistemas especialistas que tomam decisões nos setores financeiro, militar e até mesmo médico. Testes mostram que sistemas de diagnóstico médico artificiais são capazes de tomar decisões mais acertadas que as de um cirurgião humano. Hoje eu ainda tenho a liberdade de perguntar algo a este sistema, ele me dá a resposta e eu decido. Mas suponhamos que daqui a 10 anos este sistema esteja aperfeiçoado, com um desempenho excelente. O que acontecerá legalmente a um médico que, confiando na sua intuição profissional, desrespeitar a sugestão da máquina e o seu paciente vier a falecer?


Entrevista feita por Luiz Paulo Juttel

Edição de Rafaela Sandrini